Cavalo Marinho

O Cavalo Marinho é um teatro de rua tradicional da Zona da Mata Norte de Pernambuco. Conduzido por música e dança, possui dezenas de figuras que podem estar pintadas, vestindo máscaras, paletós, chapéus, penas, golas ou armações de bichos. Que podem surgir em pernas de pau ou cuspir fogo. Figuras que dançam e compõe coreografias. Dançarinos que encenam. Figuras que improvisam, dialogam e interagem com o público.

Figuras e toadas tantas, que uma noite inteira se passa. Gestos e corporeidades específicos, precisos. Vitalidade e vigor físico com habilidade e beleza. Música, dança, teatro. Diversidade e riqueza que impressionam.

A maioria das tradições no Brasil se formataram como grupos musicais, cortejos, danças ou danças com encenações. O que faz do Cavalo Marinho uma das tradições mais peculiares é o fato de ter se formatado como teatro. Embora a música e a dança sejam elementos imprescindíveis, o funcionamento da brincadeira como um todo está voltado para o teatro (ver roteiro).

A religiosidade está presente em praticamente todas as brincadeiras do Brasil. Muitas delas, inclusive, são religião. O Cavalo Marinho, embora faça parte do ciclo natalino, não é devoção. É espetáculo, apresentação. Mas é antes de tudo, necessidade.

O Cavalo Marinho nasceu de artistas que têm em comum o trabalho na cana-de-açúcar. Por este motivo, se liga a um Brasil primeiro, que está na raiz da própria cana-de-açúcar. Economia que viabilizou o começo de tudo e onde as primeiras caras brasileiras começaram a surgir.

Consequentemente onde também começaram a surgir as primeiras necessidades. Necessidades humanas antes de tudo. Necessidades que geram, que produzem, que movem, que transformam, nem que seja por uma noite. O Cavalo Marinho é fruto dessa necessidade, desse Brasil primeiro.


ROTEIRO GERAL DO CAVALO MARINHO

No Cavalo Marinho, o roteiro geral é um “Baile” que o “Capitão Marinho” vai oferecer ao “Santo Rei do Oriente”. Ele contrata dois negros, o “Mateus” e o “Bastião”, para tomar conta do terreiro. Após chegar de uma viagem, os negros se dizem donos do lugar e o “Capitão” é obrigado a chamar o “Soldado da Gurita”. De repente, quando tudo parece voltar ao normal, surge o “Empata Samba” que, como o nome sugere, interrompe a brincadeira. A festa só tem continuidade quando o “Mané do Baile” abre o terreiro para o “Baile”.

A partir daí acontece uma sequência de várias coreografias, também chamadas de “Dança dos Arcos”, entre elas o “São Gonçalo”, o “Jerimum”, a “Marieta”, a “Cobra”, a “Roseira” e outras, elaboradas em conjunto pelos “Galantes”, “Damas”, “Pastorinha” e “Arlequim” e o “Capitão” como o “Puxador dos Arcos”.

É também o momento do “Capitão” e cada “Galante” dizerem suas loas. Já o “Mateus” e o “Bastião” só dizem as suas obrigados pelas figuras dos “Capitães de Campo”.

Depois dos “Arcos” é a vez do próprio “Capitão Marinho” vir montado em seu cavalo, por isso a figura é chamada de “Cavalo Marinho”, que também dá nome a toda brincadeira.

Para seguir adiante, o “Capitão” manda chamar o “Mestre Ambrósio”, um mascate que “vive no mundo, comprando, vendendo e trocando figura”, para negociar algumas delas e realizar a brincadeira.

Depois do “Ambrósio” as figuras não obedecem uma ordem de entrada. O “Matuto da Goma”, o “Selador e Seu Campelo”, o “Vila Nova”, “Seu Domingos”, a “Véia do Bambu”, são algumas que podem cortar a madrugada.

O “Vaqueiro” dá início a sequência final, com seu filho, “Mané”, montado numa “Burra”. Mas só quando a barra do dia vem quebrando é que o terreiro recebe o “Boi”. Depois dele, para finalizar, a “Despedida” e uma roda de “Côco”.

Existem variações nesse roteiro. Alguns Mestres podem ser citados como representantes de algumas dessas variações: Mestre Inácio Lucindo, Mestre Salustiano e Mestre Batista. A sequência apresentada aqui é praticada pelos Mestres Grimário, Biu Alexandre, Biu Roque, Mariano Teles, entre outros, que seguem a que era praticada pelo Mestre Batista.

Helder Vasconcelos